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Arquitetura Moderna (4/4) O Reordenamento Urbano de uma Praia — o Caso de Porto de Galinhas

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Publicado em Sun Apr 11 17:43:00 UTC 2004 - Edição 289

No início dos anos 70, eu e Jerônimo Cunha Lima, na época arquitetos recém-formados, fomos contratados por um jovem empresário do setor imobiliário para projetar um loteamento na hoje nacionalmente famosa praia de Porto de Galinhas. A área paradisíaca era um imenso coqueiral, com uma rua principal onde se localizavam as casas dos pescadores e as pousadas populares que atendiam os banhistas da Zona da Mata. Próxima à beira-mar, a rua se dividia em duas, e ali se viam algumas casas de veraneio, com a caligrafia típica das construções vernaculares que configuravam o pequeno povoado.

 

Propusemos um ordenamento que teve como conceito “construir sem a perda da exuberância do fantástico coqueiral”. Criamos praças quadradas para onde se voltavam os lotes. Todas elas tinham ligação nos quatro vértices com praças menores, limítrofes a ruas perpendiculares ao mar e a via dos fundos dos terrenos de beira-mar. Com exceção de uma, central ao traçado, com trinta metros de largura, portal permanente de quem vinha de trás, chegando até a beira-mar.

 

Tal proposta mantinha praticamente 50% da gleba com o fantástico coqueiral, que, juntamente com a praia de areais brancas, piscinas naturais e águas límpidas, tornavam Porto de Galinhas um paraíso tropical. Era uma proposta ousada, fruto da afoiteza comum aos jovens e aceita também pelo empresário, liberto dos coeficientes de “lucro e rentabilidade” que hoje dominam o mercado. Ingenuidade pensar que o poder público na época manteria essas áreas públicas na sua condição original. Ingenuidade acreditar que os futuros proprietários do terreno teriam a consciência de manter aquela paisagem. Ledo engano pensar que a ganância dos futuros proprietários dos lotes não se exacerbaria, tirando eles mesmos a beleza natural do lugar.

 

A metamorfose se deu. As praças foram invadidas; as ruas, desfiguradas com ampliações desordenadas dos muros. A avenida principal, portal da praia, foi ocupada com aval do município. A beira-mar, a exemplo das praças, foi totalmente invadida por bares e restaurantes. Os carros, que tinham guarida nas praças menores, hoje disputam espaço com os pedestres, no meio da rua. Perdeu-se a leitura de tudo.

 

No entanto, Porto de Galinhas ganhou notoriedade nacional. Foi alçada ao posto de mais badalada praia de Pernambuco, “point” de gente jovem e bonita, por suas piscinas naturais, proximidade do Recife e vários empreendimentos hoteleiros. Ganhou também, mesmo dentro dessa desordem arquitetônica, uma certa unidade de tratamento turístico, uma simbologia gráfica nas suas butiques, bares, lojas e centenas de pousadas.

 

Porto de Galinhas hoje é um sucesso, mas chegou ao seu limite. Ou se retoma um ordenamento, com um plano viário que responda ao fluxo existente, ou tudo o que foi conquistado entrará em saturação, invertendo a curva ascendente.


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